Frasier(1993 - 2004) é provavelmente o spin-off de maior sucesso que consigo lembrar. Onze temporadas de sucesso, tendo como protagonista um personagem popular, mas não do elenco original, de Cheers(1982 - 1993). Uma série sempre lembrada com carinho pelos fãs e no geral fácil de se acompanhar por qualquer episódio aleatório.
Esse carinho era pontuado com um certo temor de que houvesse um remake que manchasse esse legado tentando modernizar as coisas para simplesmente conseguir mais lucros com essa propriedade intelectual. Algo justo, especialmente quando vivemos em tempos onde apostar em criatividade e novidades é considerado um risco e as pessoas querem se agarrar ao conforto de coisas e estéticas que já conhecem.
Com quase todo o elenco da série ainda vivo e saudável, era questão de tempo que houvesse alguma proposta irrecusável para um retorno. Sendo assim, não foi nenhuma surpresa ver o pânico se instaurar assim que houve a confirmação do reboot/continuação da história que acabou em 2004. Parte dessas pessoas se sentiu ainda mais correta ao ver que praticamente ninguém do elenco original voltaria. Esse terror se justificou?
Não.
Até agora essa versão tem 10 episódios, foi renovada para mais uma temporada em fevereiro. Aqui temos Frasier Crane(Kelsey Grammer) de volta à Boston, terra de Cheers, após anos em Chicago e Seattle(terra onde se passou a série de 1993). Há toda uma gama de personagens a serem apresentados, desenvolvidos e o dilema de como encaixar um personagem esnobe, com gostos elegantes, diretamente da década de 90 ao século 21.
E um trabalho bem honesto foi feito até aqui.
É uma comédia historicamente que tem três bases: referências intelectuais, comédia física e diferenças familiares. As três seguem intactas. As citações aos personagens ausentes são muito bem feitas, os novatos tem seu espaço pra brilhar, até os coadjuvantes tem seu devido destaque. Situações antigas da série são revistas com algumas surpresas(Por exemplo, na série de 1993, é descoberto que Frasier mentiu pro pessoal de Cheers que seu pai estava morto pra não contar que ele era policial com gostos populares. Nessa nova série, Frasier descobre que seu filho bombeiro mentiu pros seus colegas pra não contar que seu pai é um psicólogo celebridade do rádio/TV/professor de Havard), pessoas novas mostram ecos de pessoas clássicas, mas com variações interessantes.
E Frasier segue basicamente o mesmo, errando como se fosse 1994 de novo. E tentando ser uma pessoa melhor, enquanto se atrapalha durante o processo. Aquela estrutura clássica de sitcom que hoje não é tão popular na internet, mas ainda atrai milhões de pessoas semanalmente em canais como a CBS e movimenta certos cantos das redes.
Não foi escrita por roteiristas daquela época, mas por fãs. Gente que de vez em quando tenta escrever suas séries favoritas, as encaixando nos tempos atuais. Gente talentosa que finalmente teve sua chance de brilhar e colocar seu tempero em situações clássicas. O fato de Grammer ter dirigido alguns dos episódios certamente também ajudou.
Alguns dos pontos altos foram com os retornos pontuais de gente clássica, como Lilith(Bebe Neuwirth) e Roz(Peri Gilpin). A dose certa de nostalgia e de poder acompanhar e envelhecer com personagens que fizeram parte da memória de gerações por décadas. Pra que isso funcionasse, bons roteiros eram necessários. Foi um trabalho bem feito.
Se acabasse só nessa temporada, no episódio de Natal, até estaria de bom tamanho. Mas há potencial para mais. Essa é uma série que respeita a inteligência dos fãs, não oferece mais do que promete, não mente para os fãs e de um tipo de humor que atualmente é quase uma arte perdida.
Se eu, que tenho preguiça para streaming, e com isso vejo menos coisas do que gostaria, parei pra ver e estou recomendando, é porque vale a pena. 10 episódios de 22 minutos, é fácil pra vocês que gostam de maratonar.